Gleice Teixeira passará a coroa de Deusa do Ébano para a próxima representante no Carnaval do Ilê Aiyê, com a certeza do dever cumprido ao desfilar como rainha do bloco afro mais antigo do Brasil. O resultado da escolha será divulgado no dia 28 de janeiro, mas a expectativa é altíssima no Curuzu depois do bloco ter passado dois anos sem desfilar por conta da suspensão do Carnaval devido à pandemia. Consequentemente, foram dois anos sem realizar a Noite da Beleza Negra, que define anualmente a nova representante.
Coroada excepcionalmente por três anos, Gleice descreve essa passagem como necessária para que outras mulheres negras vivam a experiência de valorizar sua ancestralidade. “Acredito que já somos deusas e rainhas, mas foi nessa casa que eu aprendi a me achar bonita, gostar do meu cabelo e tomar posse de que aqui somos inspiração para tantas pessoas”, descreve.
As mulheres que desejam o título se inscreveram para a pré-seleção que ocorre antes da noite em que é anunciado o nome da vencedora. A comissão organizadora do Ilê realizou a primeira etapa ontem, às 15h, na Senzala do Barro Preto, sede do bloco.
Esbanjando roupas coloridas, turbantes e outros acessórios ornamentados com búzios e miçangas, 68, das 108 inscritas compareceram ao galpão para mostrar porque desejavam receber a honraria em 2023. Dessas, 14 foram aprovadas para a próxima fase: a 42º Noite da Beleza Negra do Ilê Aiyê.
Depois de quatro anos tentando, Daiane de Souza, 30, não conseguiu segurar as lágrimas quando ouviu seu nome sendo anunciado entre as selecionadas para a final. “Acredito que eu estou mais madura. Eu persisti e, se passar, pretendo representar minha ancestralidade e as pessoas que vieram antes de mim, mas não tiveram a mesma oportunidade”.
A esteticista Laís Ferreira, 26 anos, também está entre as selecionadas e, assim como Daiane, sabe bem o que quer como Deusa do Ébano. “Enquanto mulher negra e trans, me sinto incluída em participar dessa oportunidade que o Ilê nos dá, de quebrar a estatística de que uma mulher como eu tem que estar nas ruas. Eu quero mostrar que, assim como eu, outras podem ocupar esse espaço”, afirma.
Ela e Yara Sereya, 34, são as primeiras mulheres trans a participar da seleção. Mesmo não tendo avançado para a próxima fase, Yara representou outra novidade no concurso: a ampliação da idade de 18 a 30 anos, para 18 a 35.
Entre os critérios, como descreve uma das juradas do concurso, eleita a Deusa do Ébano de 2013, Daiana Ribeiro, estão o nível de consciência cidadã em relação ao papel da mulher negra na sociedade e a performance em dança afro.
“Para representar o Ilê, uma mulher negra precisa de persistência, resistência e conhecimento da nossa história. Não só na esfera do Carnaval, mas também dos nossos projetos sociais. O Ilê é Carnaval, mas não o ano inteiro, ele vai além: é um projeto social que transforma vidas”, destaca a jurada que, há 9 anos faz parte do bloco afro.
Entre as atribuições do reinado, a Deusa do Ébano terá que se apresentar ao lado da Band’Aiyê no Carnaval 2023. Para o retorno à folia, o bloco dedicará o tema do desfile ao centenário do angolano Agostinho Neto, uma das maiores figuras da luta de emancipação nacional e social de Angola.
Selecionadas
Deisivania dos Santos Silva
Larissa Valéria Sá de Sacramento
Ingrid Silva do Nascimento
Larena Santos da Silva
Mairine Pereira Nonato
Tamara Matos dos Santos França
Tailane Brito Santos
Mercia Cristina Silva Machado
Lais de Araujo Ferreira
Jamile Fátima de Oliveira Santos
Daiane de Souza Conceição
Caroline Xavier de Almeida Tuane Vitória Pereira
*Com a orientação da subchefe de reportagem Monique Lôbo